Bom dia, flores do dia. Antes de mais nada, vou recapitular minha longa história envolvendo Percy Jackson e os livros de Rick Riordan num geral.
Conheci Percy Jackson da maneira "tradicional", ou seja, vi os filmes primeiro. Mais especificamente, vi o segundo filme e depois o primeiro, lá pra 2013, quando tinha 10 anos. Lembro de ter achado legalzinho, mas não me tornei um aficionado nem nada que nem me ocorria quando via, por exemplo, um Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban ou Crônicas de Nárnia passando na TV. No entanto, minha mãe achou de bom tom me presentear com o box dos livros no meu aniversário de 2014. Eu apenas dei de ombros e fui dar uma folheada. Me amarrei logo de cara. Obviamente, teve o baque da história dos livros ser drasticamente diferente (e melhor) que a dos filmes (eu fiquei surpreso que o Percy tinha 12 anos no livro, entre outras coisas, mas isso foi o que mais me marcou de diferença), mas não só isso: a história, aos olhos de um pré-adolescente, é sensacional, e o humor e acidez na narração parece ter sido feito sob medida para mim. Li todos os 5 livros principais ao longo do ano, e no ano seguinte, comecei a ler a saga que dá sequência a Percy Jackson e os Olimpianos, Heróis do Olimpo. Naquela época, achava-se que esses seriam os últimos livros do Riordan envolvendo o Percy e mitologia grega. Fui indo atrás de Crônicas dos Kane (livros sobre mitologia egípicia de Riordan) e do primeiro livro de Magnus Chase e os Deuses de Asgard, quando o Riordan lançou o primeiro livro de As Provações de Apolo. Eu já estava ficando meio enjoado da "fórmula Riordan", e ver que ele ia espremer mais a laranja da mitologia greco-romana me deu uma desanimada de continuar lendo os livros dele. Até hoje eu ainda não passei do primeiro Magnus Chase (pra quem não sabe, todas as mitologias estão conectadas nos livros de Riordan) e jurei só continuar quando Riordan finalmente fizer seu Ultimato de mitologias (pelos spoilers que eu li do último livro de Provações, parece que ele está dando indícios de que muito em breve irá fazer isso). Fui crescendo, meu gosto literário foi mudando, já não era mais o público alvo do Riordan, mas ainda assim, Percy Jackson tinha (e tem) um lugar no meu coração. Tanto que em vários fóruns, sites, e redes sociais, eu cheguei a usar a foto de perfil de Leo Valdez, um dos personagens do Riordanverse (particularmente meu favorito). Cheguei a revisitar os livros (indo pelo menos até Heróis do Olimpo) vez ou outra, e embora eu não considere mais Percy Jackson o suprassumo da literatura como considerava com ternos 11 anos de idade, eu ainda acho uma literatura infantojuvenil bem competente e divertida, que (quase) sempre deixava um gosto de quero mais. Fui percebendo que não foi só pelo humor e ação que eu me cativei pela história, e sim pelos dilemas que Percy enfrenta por ser neurodivergente. Eu me via em muitos perrengues que o Percy passa envolvendo estudos e capacitismo da parte de terceiros, embora minha história e neurodivergência sejam bem menos drástica que a dele. Isso me deu uma perspectiva renovada sobre o personagem e o que ele significa não só pra mim, como para muitas pessoas. Eu cheguei inclusive a reler o primeiro livro, O Ladrão de Raios, em preparação para a série, que eu estive acompanhando os bastidores desde o dia em que o Rick anunciou que estava tentando se reunir com a Disney para tentar um reboot no audiovisual. Após 3 anos desde o anúncio (10 anos desde o último filme live action), finalmente chegou a tão aguardada série, e essa será a minha análise.
Vamos começar pelo positivo: o orçamento robusto realmente se reflete nos sets e na produção num geral. Figurinos, cenários, CGI, tudo super bem recriado, com destaque para o Mundo Inferior e Monte Olimpo. Mesmo não seguindo verbatim a descrição dos livros, são locações imponentes e bem feitas. Talvez o único defeito seja o uso da infame tecnologia Volume, que começou como algo promissor lá nos idos de 2020 (época em que a série foi anunciada), mas com o passar do tempo se provou um artifício que poucos sabem utilizar de maneira eficaz. Os atores num geral cumprem bem o seu papel (com exceção talvez do Hades de Jay Duplass), e os atores mirins, pelo menos Walker Scobell e Leah Jeffries (que vivem Percy e Annabeth, respectivamente) aos poucos ficam mais confortáveis nos seus papeis, mesmo não sendo uma das melhores atuações juvenis que tenha visto na vida. As melhores atuações talvez venham dos adultos mesmo, com destaque para a Sally Jackson de Virginia Kull, que dá uma interpretação mais imponente da personagem comparado a sua versão literária, diferença essa bem executada. O saudoso Lance Reddick, nos poucos minutos que participa como Zeus, também dá o nome. Além disso, todos parecem muito empolgados em participar da série. Rick Riordan, aparentemente, se aproveitou do novo meio para reformular vários trechos da história. Pode não ser a adaptação ipsis literis que muitos desejavam, mas eu considero uma abordagem válida. No seu melhor, resulta em episódios como o quinto, que embora sejam bem diferentes dos respectivos capítulos em que se baseiam, são igualmente bons (ou até melhores). Uma das principais reclamações em relação aos filmes é a retirada quase completa dos arcos dramáticos dos personagens, e no geral, é um dos fortes da série, que realmente não ignora o drama da história (no máximo apara algumas pontas, como a do Gabe Ugliano, mas são meros detalhes). Inclusive, temos a adição de flashbacks com o Percy criança (interpretado por Azriel Dalman), que dão mais contexto à vida pregressa de Percy e seus dramas e a luta de sua mãe para garantir a segurança de seu filho. A série dá uma base mais sólida para os conflitos dos personagens envolvendo a falta de uma presença paternal na vida delas, e os abusos e descasos por parte do Olimpo, algo que permeia toda a saga literária.
Agora vamos ao negativo: o que mais salta aos olhos (e praticamente todo mundo destaca como algo negativo) é essa decisão bizarra de transição de cenas usando um telão preto. É algo que quebra totalmente o flow. Além disso, embora a direção num geral seja "correta", também não tenta nada demais mesmo quando deveria. Não é algo que eu enxergue como o "principal" problema, mas em episódios como o sétimo uma direção mais energética fez falta (até mesmo o filme conseguiu entregar um Cassino Lótus mais animado. E cadê a zebra?). Percy Jackson em terceira pessoa realmente não é esse piadista que muitos fãs dizem ser, é uma pessoa mais fechada e ranzinza, mas ainda assim, deviam ter levado em consideração que o que cativou tantos leitores foi o humor com o qual a mitologia grega é apresentada no universo de Riordan. Para suprir a falta da narração "humorada" de Percy, podiam ter enfatizado mais a galhofa e esquisitice da modernização da mitologia no século XXI. Aqui é algo muito seco, embora tenha seus momentos, como por exemplo, o Dionísio, Ares e até mesmo o Hades (embora ainda ache que o ator em si não seja o ideal para o papel). A direção mais sólida dessa temporada é a de James Bobin (vindo de Alice Através do Espelho e Dora e a Cidade Perdida), que mesmo não sendo um grande diretor, faz um feijão com arroz decente com direito a uma ótima luta contra o Minotauro (talvez a melhor luta de toda a série). Outro defeito são os episódios curtos, que eu inicialmente defendi por considerar que os eventos dos livros ao serem levados para o audiovisual resultam em algo curto, mas depois acabei percebendo que, com todas essas modificações e o foco no drama e diálogos, episódios mais longos ajudariam a equilibrar melhor o negócio, dando mais espaço para a trama respirar, desenvolver melhor alguns conceitos e monstros. Num geral, não pego tanto no pé em relação a falta de ação (em especial no quarto e quinto episódios) pois o primeiro livro em si não é tão focado nisso, mas ainda dava pra construir melhor a tensão em alguns momentos, e episódios maiores + direção melhor ajudariam muitíssimo. Por fim, temos também a decisão deles saberem previamente quais são os desafios que irão enfrentar. Algo que funciona, por exemplo, com a Medusa, pois convenhamos, uma loja de estátuas cheia de criaturas mitológicas sob a tutela de uma senhora que cobre o rosto e se chama Tia Eme é algo óbvio demais, principalmente para uma filha de Atena como Annabeth. Porém, para monstros como o Crosta (ou Procrusto) acaba sendo meio broxante. Inclusive, Crosta é um monstro que dava pra ser cortado facilmente (no próprio livro já é um monstro meio bucha) e substituído pelo Caronte no mundo superior, outro ponto em que poderiam explorar mais o humor de Riordan, com o Caronte sendo um negro suave que coleciona ternos italianos no mundo superior e protege a entrada principal do Mundo Inferior que por sua vez se encontra num estúdio de Hollywood.
Considerações finais: Poderia escrever pilhas e pilhas sobre o que achei, mas em resumo, foi um resultado misto. Devo dizer que eu terminava a maioria dos episódios satisfeito (exceto o do Cassino), e os problemas iam vindo à minha mente mais quando eu refletia sobre. No fim das contas, é uma série assistível, com bons personagens, produção bem feita e inovações em relação ao material base, mas com algumas falhas técnicas e até mesmo algumas decisões narrativas que saíram pela culatra que se resolverem na segunda temporada, pode resultar em algo realmente bom e mais equiparável aos livros. Melhor que o primeiro filme, mesmo que não por muito, e claro, MUITO melhor que a joça que foi o segundo filme. Torço realmente que, caso a série seja renovada, eles evoluam, e não regridam como acabou acontecendo com os filmes.
Vamos começar pelo positivo: o orçamento robusto realmente se reflete nos sets e na produção num geral. Figurinos, cenários, CGI, tudo super bem recriado, com destaque para o Mundo Inferior e Monte Olimpo. Mesmo não seguindo verbatim a descrição dos livros, são locações imponentes e bem feitas. Talvez o único defeito seja o uso da infame tecnologia Volume, que começou como algo promissor lá nos idos de 2020 (época em que a série foi anunciada), mas com o passar do tempo se provou um artifício que poucos sabem utilizar de maneira eficaz. Os atores num geral cumprem bem o seu papel (com exceção talvez do Hades de Jay Duplass), e os atores mirins, pelo menos Walker Scobell e Leah Jeffries (que vivem Percy e Annabeth, respectivamente) aos poucos ficam mais confortáveis nos seus papeis, mesmo não sendo uma das melhores atuações juvenis que tenha visto na vida. As melhores atuações talvez venham dos adultos mesmo, com destaque para a Sally Jackson de Virginia Kull, que dá uma interpretação mais imponente da personagem comparado a sua versão literária, diferença essa bem executada. O saudoso Lance Reddick, nos poucos minutos que participa como Zeus, também dá o nome. Além disso, todos parecem muito empolgados em participar da série. Rick Riordan, aparentemente, se aproveitou do novo meio para reformular vários trechos da história. Pode não ser a adaptação ipsis literis que muitos desejavam, mas eu considero uma abordagem válida. No seu melhor, resulta em episódios como o quinto, que embora sejam bem diferentes dos respectivos capítulos em que se baseiam, são igualmente bons (ou até melhores). Uma das principais reclamações em relação aos filmes é a retirada quase completa dos arcos dramáticos dos personagens, e no geral, é um dos fortes da série, que realmente não ignora o drama da história (no máximo apara algumas pontas, como a do Gabe Ugliano, mas são meros detalhes). Inclusive, temos a adição de flashbacks com o Percy criança (interpretado por Azriel Dalman), que dão mais contexto à vida pregressa de Percy e seus dramas e a luta de sua mãe para garantir a segurança de seu filho. A série dá uma base mais sólida para os conflitos dos personagens envolvendo a falta de uma presença paternal na vida delas, e os abusos e descasos por parte do Olimpo, algo que permeia toda a saga literária.
Agora vamos ao negativo: o que mais salta aos olhos (e praticamente todo mundo destaca como algo negativo) é essa decisão bizarra de transição de cenas usando um telão preto. É algo que quebra totalmente o flow. Além disso, embora a direção num geral seja "correta", também não tenta nada demais mesmo quando deveria. Não é algo que eu enxergue como o "principal" problema, mas em episódios como o sétimo uma direção mais energética fez falta (até mesmo o filme conseguiu entregar um Cassino Lótus mais animado. E cadê a zebra?). Percy Jackson em terceira pessoa realmente não é esse piadista que muitos fãs dizem ser, é uma pessoa mais fechada e ranzinza, mas ainda assim, deviam ter levado em consideração que o que cativou tantos leitores foi o humor com o qual a mitologia grega é apresentada no universo de Riordan. Para suprir a falta da narração "humorada" de Percy, podiam ter enfatizado mais a galhofa e esquisitice da modernização da mitologia no século XXI. Aqui é algo muito seco, embora tenha seus momentos, como por exemplo, o Dionísio, Ares e até mesmo o Hades (embora ainda ache que o ator em si não seja o ideal para o papel). A direção mais sólida dessa temporada é a de James Bobin (vindo de Alice Através do Espelho e Dora e a Cidade Perdida), que mesmo não sendo um grande diretor, faz um feijão com arroz decente com direito a uma ótima luta contra o Minotauro (talvez a melhor luta de toda a série). Outro defeito são os episódios curtos, que eu inicialmente defendi por considerar que os eventos dos livros ao serem levados para o audiovisual resultam em algo curto, mas depois acabei percebendo que, com todas essas modificações e o foco no drama e diálogos, episódios mais longos ajudariam a equilibrar melhor o negócio, dando mais espaço para a trama respirar, desenvolver melhor alguns conceitos e monstros. Num geral, não pego tanto no pé em relação a falta de ação (em especial no quarto e quinto episódios) pois o primeiro livro em si não é tão focado nisso, mas ainda dava pra construir melhor a tensão em alguns momentos, e episódios maiores + direção melhor ajudariam muitíssimo. Por fim, temos também a decisão deles saberem previamente quais são os desafios que irão enfrentar. Algo que funciona, por exemplo, com a Medusa, pois convenhamos, uma loja de estátuas cheia de criaturas mitológicas sob a tutela de uma senhora que cobre o rosto e se chama Tia Eme é algo óbvio demais, principalmente para uma filha de Atena como Annabeth. Porém, para monstros como o Crosta (ou Procrusto) acaba sendo meio broxante. Inclusive, Crosta é um monstro que dava pra ser cortado facilmente (no próprio livro já é um monstro meio bucha) e substituído pelo Caronte no mundo superior, outro ponto em que poderiam explorar mais o humor de Riordan, com o Caronte sendo um negro suave que coleciona ternos italianos no mundo superior e protege a entrada principal do Mundo Inferior que por sua vez se encontra num estúdio de Hollywood.
Considerações finais: Poderia escrever pilhas e pilhas sobre o que achei, mas em resumo, foi um resultado misto. Devo dizer que eu terminava a maioria dos episódios satisfeito (exceto o do Cassino), e os problemas iam vindo à minha mente mais quando eu refletia sobre. No fim das contas, é uma série assistível, com bons personagens, produção bem feita e inovações em relação ao material base, mas com algumas falhas técnicas e até mesmo algumas decisões narrativas que saíram pela culatra que se resolverem na segunda temporada, pode resultar em algo realmente bom e mais equiparável aos livros. Melhor que o primeiro filme, mesmo que não por muito, e claro, MUITO melhor que a joça que foi o segundo filme. Torço realmente que, caso a série seja renovada, eles evoluam, e não regridam como acabou acontecendo com os filmes.
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